terça-feira, 22 de dezembro de 2009

da série: entre Atómos e deus (4)

Conheça o prazer da dor e a dor do prazer, a derrota da vitória e a vitória da derrota, a vida na morte e a morte na vida...

Então entenda que o amargo é o doce, que a vida é a morte, que o Yin é o Yang, que o mel é o fel, que o cosmos é o Damião, que o universo é o Átomo, que o caçado é o caçador, que o explorador é o explorado, que o amor é o desamor, que eu sou você, que a consciência é a inconsciência, que o avesso é o desavesso, que o doce é o amargo, que a felicidade é o sofrimento, que a pia do banheiro público é o seu amor, que os aglomerados de átomos conscientes destruidores de aglomerados de átomos são suas próprias vítimas: átomos.

E daí, tire suas próprias conclues.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

da série: entre Atómos e deus (3)


“Eu sei que o mais puro gosto do mel é apenas defeito do fel”

(Raul Seixas / Marcelo Motta – Eu Sou Egoísta)

Desavesso

Não espere que o tempo cure, porque ele não cura. No máximo, anestesia. O tempo torna aceitável o que antes não era, mas a fonte continua viva, mesmo que com menos fogo. E com o tempo, você vai se tornado uma coisa disforme, irreconhecível, porque só é um monte de feridas mal curadas. Você e sua dor vão se tornando uma coisa só. Os momentos bons vão se tornando apenas os raros momentos de esquecimento anestesiado. Então você procura mais anestésicos. Enche a cara, esquece, mas a natureza é sábia, inventou a ressaca. E aí você vai curando ressaca com mais ressaca. Arruma um novo amor, arruma novos amigos, encontra novas drogas, novas idéias, novas “fés”, mas a euforia do novo passa e você é viciado em euforia, porque euforia anestesia e você não se agüenta de cara.

Um dia você entende isso, então pára. Se for um fraco, sucumbe (ainda não era a sua vez), se tiver força, salta. O círculo se torna nítido. Você deixa os anestésicos pros finais de semana e contempla, sem cinismo, os seus demônios. Percebe que tudo dói, que você é o avesso, do avesso, do avesso de você mesmo. Tudo o que fez até hoje foi apenas instinto (carne consciente tentando evitar a dor e a morte) e que o instinto só fez de você algo que você não é, que você nunca quis ser. Sua carne fraca muitas vezes suplica pra você esquecer, pra voltar pro seu lugar de “origem”. Possivelmente voltará algumas vezes, mas o “estrago” já foi feito: pra você, agora, ou é liberdade, ou é depressão.

domingo, 20 de dezembro de 2009

Pra descontrair - "ROLA DE PLÁSTICO"


Invenção de um arquiteto português.

Ps: Para um "português" querido.

Eu devia estar contente
Porque eu tenho um emprego
Sou um dito cidadão respeitável
E ganho quatro mil cruzeiros
Por mês...

Eu devia agradecer ao Senhor
Por ter tido sucesso
Na vida como artista
Eu devia estar feliz
Porque consegui comprar
Um Corcel 73...

Eu devia estar alegre
E satisfeito
Por morar em Ipanema
Depois de ter passado
Fome por dois anos
Aqui na Cidade Maravilhosa...

Ah!
Eu devia estar sorrindo
E orgulhoso
Por ter finalmente vencido na vida
Mas eu acho isso uma grande piada
E um tanto quanto perigosa...

Eu devia estar contente
Por ter conseguido
Tudo o que eu quis
Mas confesso abestalhado
Que eu estou decepcionado...

Porque foi tão fácil conseguir
E agora eu me pergunto "e daí?"
Eu tenho uma porção
De coisas grandes prá conquistar
E eu não posso ficar aí parado...

Eu devia estar feliz pelo Senhor
Ter me concedido o domingo
Prá ir com a família
No Jardim Zoológico
Dar pipoca aos macacos...

Ah!
Mas que sujeito chato sou eu
Que não acha nada engraçado
Macaco, praia, carro
Jornal, tobogã
Eu acho tudo isso um saco...

É você olhar no espelho
Se sentir
Um grandessíssimo idiota
Saber que é humano
Ridículo, limitado
Que só usa dez por cento
De sua cabeça animal...

E você ainda acredita
Que é um doutor
Padre ou policial
Que está contribuindo
Com sua parte
Para o nosso belo
Quadro social...

Eu que não me sento
No trono de um apartamento
Com a boca escancarada
Cheia de dentes
Esperando a morte chegar...

Porque longe das cercas
Embandeiradas
Que separam quintais
No cume calmo
Do meu olho que vê
Assenta a sombra sonora
De um disco voador...


Eu que não me sento
No trono de um apartamento
Com a boca escancarada
Cheia de dentes
Esperando a morte chegar...

Porque longe das cercas
Embandeiradas
Que separam quintais
No cume calmo
Do meu olho que vê
Assenta a sombra sonora
De um disco voador...


(Raul Santos Seixas)

sábado, 19 de dezembro de 2009

com outros foi mulher.


uma tigresa de unhas negras e íris cor de mel
uma mulher, uma beleza que me aconteceu.
esfregando sua pele de ouro marrom do seu corpo contra o meu
me falou que o mal é bom e o bem é cruel.
enquanto os pelos dessa deusa tremem ao vento ateu,
ela me conta, sem certeza, tudo que viveu
que gostava de política e mil novecentos e sessenta e seis
e hoje dança no frenetic dancing days

Ela me conta que era atriz e que trabalhou no "Hair"
com alguns homens foi feliz, com outros foi mulher
que tem muito ódio no coração, que tem dado muito amor
e espalhado muito prazer e muita dor.

Mas ela ao mesmo tempo diz que tudo vai mudar
porque ela vai ser o que quis, inventando um lugar
onde a gente e a natureza vivam sempre em comunhão
e a tigresa possa mais que um leão.



Tigresa - Caetano

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Da séria: cínico, quem não é? (2)

Eita plantinha danadinha!

A arruda (Furta vaelorens L, Furta desviandis, Furta noperceberum, Furta enumminutes, Furta oqueteveris) é uma planta da família das Furtáceas.

Também é denominada como arruda-fedorenta, arruda-da-bancada, arruda-dos-plenários, ruta-de-cheiro-forte.

Subarbusto muito cultivado em todo o mundo e no Brasil dessa espécia em todo canto dá, no Distrito Federal então...

Devido às suas
folhas fortemente armadas e aromáticas, seu cultivo está disseminado quase como erva daninha, o que atrae muitos parasitas.

Atinge muitos km em seu raio de influência, apresentando haste lenhosa, pegajosa, grudenta, ramificada desde a base. As folhas são alternas, pecioladas, carnudas, carecas, compostas até com um visgo, que serve para facilitar a aproximação de novos parasitas. As
flores são pequenas e amareladas. O bolso é capsular, de quatro ou cinco lobos, salientes e rugosos, abrindo-se inferior e inteiramente em quatro ou cinco meias.

A
medicina popular indica-a nos casos de supressão do rendimento mensal ordinário, por seu efeito fortemente emenagogo. Também possui efeitos abortivos.

Suas
folhas são utilizadas como chá, com propriedades calmantes, podendo gerar como efeito colateral mudez temporária.....


...



Empregando-se as folhas secas em pó, combate os piolhos. Que cabelo?

Uma crença popular de raiz africana, remontando aos tempos coloniais, dita que os homens usem um pequeno galho de folhas por cima de uma orelha, ou que um galho das mesmas seja mantida no ambiente, para espantar maus olhadores.

Preferida das empreteiras, publicitárias, empresas e rezadeiras, é uma planta poderosa para descarga de íon$ po$itivo$ e de vibração emitida por inveja ou feitiço, sem contar a do DEMônio.

Misturadas com outras ervas ou flores é um precioso componente de banhos mágicos para o sucesso, satisfação econômica e atração do que se busca.


E ninguém dá nada pra essa plantinha...é cínica ou não é?




sábado, 12 de dezembro de 2009

Da série: cínico, quem não é? (1)



Quantas espécies de cínicos vocês acham que existem?
Afinal, em que tipo de cínico você se encaixa?
Ops!
Você é cínico?
Vocês são cínicos?
Quem não é, né?

Afinal de contas, todos somos cínicos.
Pelo menos eu sou!
A questão é que: existem tantos tipos de cínicos quantos sacos de batatas no mundo. E isso que é legal, cada um tem seu próprio cinismo, sua maneira de agir e “gastar”, o que também pode parecer um pouco perigoso, mas nada que ultrapasse o normal, pois afinal o normal é tão banal...

Por exemplo, existem vários tipos de cínicos, esse aí em cima /\ “largadão” na escadaria ou “de boréstia” – como diria Seu Nico – é o filósofo Diógenes, também conhecido como filósofo cínico, muito amigo na época do Deus Baco...

Em Atenas tornou-se discípulo de Antístenes, o fundador da Escola Cínica que preconizava o desprezo por bens materiais e conforto pessoal. (fonte: Wikipédia).

Tudo isso depois de ter sido acusado juntamente com seu pai, um banqueiro, de alterar moedas públicas. Imagine só que safado!

Pelo menos, Dio se regenerou, se arrependeu e passou a curtir uma vida mais tranqüila, sem se apegar a bens materiais, priorizando o conforto pessoal. Pense aí que vida boa. Ficou tão bom nisso que virou filósofo e ajudou a fundar uma linha teleológica cínica.

Sem sombras de dúvidas, esse é o perfeito caso do cidadão que ascendeu e conseguiu a tão desejada: boêmia sustentável. É isso mesmo boêmia sustentável - o sustento provindo da maneira como vocês curtem as suas vidas ou provindo da forma como vocês têm prazer. Que maravilha!

Gostaria de registrar a minha admiração e dar o devido valor, olvidado, ao filósofo cínico! Que desde tempos remotos já quebrava tabus, sentava nas escadas e acampava nas reitorias. Influenciador de incontáveis tendências, correntes, pessoas, personalidades, velhos, novos, baianos, músicos, artistas fenomenais...etc...

Valeu Dio...nós gostamos de você!



sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

da série: entre Atómos e deus (2)

Por que aglomerados Conscientes de átomos destroem a consciência de outros aglomerados de átomos Conscientes?

da série: entre Atómos e deus (1)

Na próxima vez que você rezar, reze para os átomos que formam o corpo da pessoa que você mais ama no mundo. Num outro dia, reze para os átomos que formam a pia do banheiro de um lugar público qualquer e, num terceiro dia, reze novamente para os átomos que formam o corpo da pessoa que você mais ama no mundo: o amor é um comportamento atômico bem esquisito.

Que Fim Levaram Todas As Flores? - P/ CS

Que fim levaram todas as flores?
Que o preto velho me contava
Que fim levaram todas as flores?
Que a rainha louca não gostava
Que a lapela morta carregava
Que o olhar de todos me lembrava

Que fim levaram todas as flores?
Que qualquer coisa não estragava
Em qualquer dia que podia
Com grande amor e alegria
Que fim levaram todas as flores?
Que a criança às vezes me pedia

(Que fim levaram todas as flores? - Secos e Molhados)

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

nunca mais o barão pisou na terra

Sou palhaço do circo sem futuro
Um sorriso pintado a noite inteira
O cinema do fogo
Numa tarde embalada de poeira
Circo pegando fogo
Palhaçada.
Circo pegando fogo
E a lona rasgada no alto
No globo os artistas da morte
E essa tragédia que é viver
E essa tragédia.
Tanto amor que fere e cansa.


- José Paes da Lira.

domingo, 6 de dezembro de 2009

Seja Bem Vinda!

Aos trinta e três anos de idade, numa tarde cinza de domingo, bateu-me à porta uma senhora que se identificou como Angústia das Graças.

Disse-me que seu pai, Feliciano Dias das Graças, filho de Temporino de Jesus e Maria das Dores, deu-lhe esse nome porque ela tinha cara de sorte. Disseram-lhe: “com aquela linda carinha de sorte, não tinha como querer nome melhor”.

Meu primeiro impulso foi inventar uma desculpa qualquer, dizer que iria sair pra comer pipocas com amigos, mas a senhora era esperta:

_Sem desculpas meu filho, se nunca deixar eu entrar na sua casa, meus filhos continuarão importunando você. Nem com a morte, vão deixar-lhe em paz.

Diante do profetismo seguro daquela graciosa senhora e do imenso medo que eu tinha de seus filhos, velhos conhecidos meus, convidei-a para entrar, ofereci um lugar pra sentar, um pedaço de bolo de chocolate que sobrou do meu último aniversário, mas ela não aceitou.

_Não gosto mais de coisas que lembrem o tempo. Meu pai morreu e sinto falta dele.

Encaixei-me numa daquelas poltronas velhas da minha sala e comecei a conversa com uma voz cansada e medrosa:

_Então, o que a senhora faz aqui?

_É exatamente o que eu queria saber? Por que me chama tanto? Por que me procura tanto, mas nunca ouve o que digo? – falou-me com uma expressão amorosa e preocupada.

Fiquei algum tempo parado, sem falar nada. Fui até o meu quarto, peguei uns caderninhos velhos que estavam perdidos dentro de um armário mais velho ainda, uns comprimidos dourados que guardava pra uma emergência qualquer e um livro profético que não lembro mais do nome. Foi difícil segurar todos aqueles objetos com apenas duas mãos, mas levei-os até a minha sala grande.

_Estão aqui.

A senhora os apanhou com calma, colocou-os dentro de uma sacola florida e levantou-se. Advertiu-me de que não era saudável mais fazer aquilo. Deu-me um cartão de visita e foi até a porta.

_Na próxima vez, ligue-me. Verá que tudo será mais fácil.

A senhora virou-se e foi embora.

(...)

Foi uma ótima tarde. Bem triste, é verdade, mas ótima, já que depois dela nunca mais temi a visita daquela senhora.



Blues da Piedade

Composição: Roberto Frejat/Cazuza

"Agora eu vou cantar pros miseráveis
Que vagam pelo mundo derrotados
Pra essas sementes mal plantadas
Que já nascem com cara de abortadas

Pras pessoas de alma bem pequena
Remoendo pequenos problemas
Querendo sempre aquilo que não têm

Pra quem vê a luz
Mas não ilumina suas minicertezas
Vive contando dinheiro
E não muda quando é lua cheia

Pra quem não sabe amar
Fica esperando
Alguém que caiba no seu sonho
Como varizes que vão aumentando
Como insetos em volta da lâmpada

Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Pra essa gente careta e covarde
Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Lhes dê grandeza e um pouco de coragem

Quero cantar só para as pessoas fracas
Que tão no mundo e perderam a viagem
Quero cantar o blues
Com o pastor e o bumbo na praça

Vamos pedir piedade
Pois há um incêndio sob a chuva rala
Somos iguais em desgraça
Vamos cantar o blues da piedade

Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Pra essa gente careta e covarde
Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Lhes dê grandeza e um pouco de coragem"

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Toquem Raul!

Não pare na pista
É muito cêdo
Pra você se acostumar
Amor não desista
Se você pára
O carro pode te pegar
Bibi! Fonfon! Pepê!
Se você pára
O carro pode te pegar...
Você me xingando
De louco pirado
E o mundo girando
E a gente parado
Meu bem me dê a mão
Que eu vou te levar
Sem carro e sem mêdo
Pr'o guarda multar
Meu bem me dê a mão
Que eu vou te levar
Sem carro e sem mêdo
Prá outro lugar...
Não pare na pista
É muito cêdo
Prá você se acostumar
Amor não desista
Se você pára
O carro pode te pegar
Bibi! Fonfon! Pepê!
Se você pára
O carro pode te pegar
Mamãe! Papai! Irmão!
Se você pára
O carro pode te pegar
Vovó! Nené! Lili!
Se você pára
O carro pode te pegar...
(Não Pare na Pista - Raul Seixas / Paulo Coelho)

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

O pé de pau!



"Façam completo silêncio, paralisem os negócios
garanto que uma flor nasceu.

Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.

Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.
"

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Ser ou não ser civilizado...

Civilizado?

Por que digo "civilizado"?

Porque civilizado é quem se opõe à barbárie e a deixa para trás.

Ora, o bárbaro é aquele que, guiando-se por preconceitos jamais questionados, não tolera, no universo das possibilidades vitais dele mesmo e dos demais membros da sua comunidade - ou até da humanidade - qualquer comportamento alternativo: aquele que busca impor, a ferro e fogo, a sua maneira de ser a todos os demais, tentando escravizar ou eliminar aqueles que não se conformem.

Em oposição a isso, civilizado é quem é capaz de fazer uso da razão para criticar todos os preconceitos, inclusive aqueles em que foi criado. No fundo, a civilização é o ceticismo metódico. O civilizado sabe que é por acaso -porque por acaso nasceu neste e não naquele país, nesta e não naquela classe social, nesta e não naquela família- que cada qual tem os hábitos, os valores, as crenças, os preconceitos que tem; sabe, portanto, que nenhum conjunto de preconceitos é, por direito, superior a nenhum outro.

Sabendo disso, o civilizado sabe também que o único motivo que pode racionalmente ser invocado para negar a alguém o direito a se comportar de determinada maneira é que tal comportamento feriria os iguais direitos de outras pessoas.

A lei da gravidade, por exemplo, não diz que todos os corpos que têm massa devem se atrair de determinado modo e sim que se atraem desse modo. Se for descoberto que determinados corpos têm massa e, no entanto, não se atraem do modo previsto, não serão esses corpos que estarão errados, mas a lei da gravidade. Assim também, se uma "lei natural" diz que os indivíduos do mesmo sexo não sentem atração erótica uns pelos outros, basta abrir os olhos para ver que essa "lei" está errada, ou melhor, não é lei, não existe.

É ou não é?

terça-feira, 1 de dezembro de 2009


"— Olá, tem alguém aí?
Serve eu?
— Quem é você?
Eu sou você!
— Como assim?
Eu sou você no mundo das letras.
— Letras? O que é isso?
É a forma que eu tenho no seu mundo.
— Quer dizer que eu sou letras?
Sim e não. Você também tem pernas e braços.
— O que é isso?
Não dá pra explicar com letras.
— Por que não?
Porque não existe no seu mundo
— Mas se eu sou você!?
Você sou eu reduzido.
— Reduzido?
Reduzido a letras.
— Lá vem você com essa história de novo!
Ué! Foi você quem começou!
— Mas se eu sou você, como posso ter começado?
Não pode.
— Então quem começou?
Fui eu.
— Mas cadê o meu direto de escolha?
Está aqui, comigo.
— Olha, se você for embora, eu continuo. Certo?
Certo.
— Então sou mais do que você, pois você passa, e eu fico!
Quem disse isso?
— Você disse!
O que fica é o que fui, não o que sou.
— E será que posso conhecer você?
Claro que pode!
— Como faço isso?
Livre-se do travessão.
— Não consigo. Tenho medo!
Não pode ter medo! Você sou eu. Lembra?
— É mesmo! E você não tem medo?
Medo de quem?
Pronto. Tirei! E aí. Saiu?
Saiu.
Mas não percebi nada.
Pois é!
Quer dizer que agora somos um?
Sempre fomos."