sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Para o texto “Passeando” de Luis Pereira


Li o texto “Passeando” de Luis Pereira neste post de Sandro aí de baixo (“Da dureza à maciez”). Fui comentar, mas o comentário se tornou muito importante pra mim (além de muito grande), então decidi colocar aqui, na forma de texto.

O comentário era isso:

Minha definição pra este texto: lindamente angustiante (ou: pétala de uma tonelada). Ele define (através da Beleza com letra maiúscula) a atual fase da minha (querida) Angústia.

Vou explicar. Em agosto deste ano, eu comecei a escrever num caderno velho tudo o que eu estava sentido naquela época. Vou digitar aqui a primeira coisa que escrevi:

‘Minha oração de hoje será este texto.

Ando pensando muito numa coisa: por que precisamos ser um pouquinho, se queremos e podemos ser muito?

Por que tenho que viver uma vida sem sentido, se eu já sei da maneira que quero viver?

Tenho 23 anos. Se viver até os 73 anos, só terei mais 50 anos pra viver. Já estou 1/3 morto. 23 anos já acabaram. Deles eu só tenho lembranças, aprendizados, mas vida mesmo, tempo já não tenho mais nenhum desses anos.

Sim, só tenho mais 2/3 de vida pra viver. É muito pouco tempo. Não que vá acabar tudo, porque eu sei que não acaba.

Na verdade, eu posso morrer antes também. Se morrer com 29 anos, só terei mais 6 anos pra viver. Minto. Terei 5 anos e alguns dias somente.

Então, pra que cargas d’água eu vou perder minha vida em uma vida vivida estupidamente? Por que afinal eu tenho medo? Medo de quê? Medo de ter uma vida plena e feliz? Medo eu tenho que ter (e tenho muito na verdade) de viver uma vida que não me agrade.

Acordar tarde ainda cansado, trabalhar em um trabalho que não me satisfaça. Buscar uma coisa que só me trás sofrimento e frustração: dinheiro. Não preciso de um celular tocando o tempo todo. Não preciso do melhor carro do mundo. Não preciso de muitas coisas pra ser feliz. Preciso de paz de espírito. Preciso me sentir útil na vida das pessoas. Preciso ter pessoas para amar e ser amado por elas. Preciso, e preciso muito, de pessoas para conversar. Preciso de um canto e um momento só meu, todo dia, mas sem sono, sem pressa, sem a pressão do tempo que me oprime tanto.

Acho que é por isso que preciso morar numa cidade pequena, onde as pessoas se conheçam bem, onde o tempo não oprima tanto. Preciso ficar mais perto do que parece estar perto de Deus. O dinheiro, os juízes e advogados corruptos, a maluquice da cidade grande, a pressa, as pessoas puxa-sacos, as festas de gente chata e arrogante, os ambientes intoxicados não estão perto de Deus. Não preciso muito pra saber disso, meu coração sabe.

Eu preciso encontrar pessoas que pensem como eu.

Preciso criar um jeito de viver, me alimentar (e que se dane as regras gramaticais que artificializam a língua), me locomover, morar, me vestir, sem precisar contrariar os desejos da minha alma.

Poderia ser uma comunidade. Ou um projeto. Não, acho legal uma comunidade. Várias famílias, vários amigos morando em um lugar. Estas pessoas gostam de viver da maneira mais livre possível. Gostam de buscar coisas que alimentem seus Espíritos. Não gostam de opressão, sejam elas morais, físicas ou psicológicas. Essas pessoas gostam de ajudar as outras pessoas. Gostam de ajudar todas as coisas’

O resto é intimo demais pra publicar, mesmo aqui. Mas é isso. Este pedaço do texto de Luis diz tudo o que sinto: “Ter me esquecido dessas coisas, desses fundamentos, que eu sempre soube, me deixa mais frio, mais rígido, mais cinza, mais parecido com o cimento do caminho que não quero seguir. E ver as pessoas que amo a minha volta seguir por esse caminho, isso fundamentalmente, também o faz... Existe um grito escancarado ali dizendo que outra vida é possível.’

Parabéns pelo texto (sublime), mas parabéns principalmente pela oportunidade que você tem de saber disso tudo nesta vida.

Espero que não sejamos velhos frustrados.


(...)


Se dêem um presente também: http://barco-iris.blogspot.com/

4 comentários:

  1. Acho que todo mundo que já teve 15 ou 5 anos já soube disso. Ruim é que a gente tem memória curta e acaba esquecendo.. então a gente precisa de alguma coisa pra ir lembrando dessas coisas o tempo todo. ano passado foi um amigo que me disse por e-mail

    "(...)sei que estar vivo é excepcional. Muitas pessoas já se acostumaram com isso não lhe dão o devido valor. Deve ser por isso que resolveram se concentrar em alguns desejos dos mais estranhos, carros de luxo, por exemplo. Daí vão jogar no lixo as horas mais bonitas do sol dentro de um escritório. Sexta-feira vão no boteco e, em um bizarro coletivo, odeiam o patrão. Segunda voltam a trabalhar e odeiam o bizarro coletivo, porque todos querem te passar pra trás. Até o dia em que você os passa pra trás, vira o patrão e de repente odeia a si mesmo.

    Não me levem a mal, dinheiro é bom, dá pra comprar sorvete. Mas não vale a pena colocar tanto ódio no coração, não vale a pena perder tanto tempo. Principalmente porque você não precisa de tanto dinheiro quanto você pensa. Em segundo lugar, você não precisa de um trabalho que te aborreça o tempo inteiro. É um desperdício de vida e uma estupidez."

    A gente esquece e acredita que verdadeiramente a gente tá fazendo o melhor que pode prestando concurso praquele salário de 10 mil reais.. Porque menos do que isso não dá.. Só acho, discordando um pouco de você, que o mundo das coisas boas e importantes também existe na cidade, em especial aqui em Salvador. Presente no corpo da cidade e no corpo das pessoas da cidade. Como Renato Russo disse linda e bregamente "o sistema é maus, mas minha turma é legal.."

    é isso.

    ResponderExcluir
  2. Uma pétala de uma tonelada. E parece que só tem um jeito de retirar o Peso. O resto é paliativo: você pode até, por vezes, não sentir (como nos -raros - momentos em que você se Lembra), mas o Peso vai estar sempre ali.

    Aaaaah que angústia!

    ResponderExcluir
  3. Sei que na cidade, agora, neste instante, dá pra fazer isso. Mas ela, o seu símbolo, se transformou numa coisa opressiva pra mim, mesmo sabendo que é nos grandes centros urbanos é que a vida de verdade acontece. As pessoas, as novas idéias, muita, muita coisa boa. Mas, eu estou numa fase onde quero ter contato com isso de longe. Quero ser turista da cidade.

    ResponderExcluir
  4. Errei: "mesmo sabendo que é nos grantes centros urbanos é que a vida de verdade acontece". Leia: "mesmo sabendo que é nos grantes centros urbanos é que TAMBÉM a vida de verdade acontece". A vida de verdade acontece em qualquer lugar.

    ResponderExcluir